Ode a Maísa

 Ode

                   a

                Maísa


   Lá ao mavioso campo,

Já brando parte Zéfiro mimoso

   Co’o leve pirilampo,

Que peregrino, ledo e fogoso,


   Ante o arbusto, adeja,

E logo baila aos ares tão disposto,

   Tanto a vida festeja,

Que esta vista abala de desgosto...


   Pois quem, o Dano, sofre

Do lépido urgir de nossas Eras,

   Sabe que em negro cofre

Jazerá o resquício das Quimeras...


   Quando os tristes mortais,

Avizinhar, sentirem, o encontro

   Com as insônias Letais,

De que varão nenhum estará pronto


   Lembrar-me-ei, Maísa,

Que honroso galardão me ofertara,

   E, ora, a alma se divisa,

Presenteando-te a metade cara.


   Que de tudo me é o restante,

E ovacionando a turba dos ausentes,

   Co’ a alma em eco ofegante,

 Gozo a acerba Dor dos ínfimos entes.


   E assim de voz funesta,

Segue o prosaico bardo inquirindo,

   Dobrando as rugas da testa:

Perdoes-me, Maísa, tal estro findo.


   Pois, palente e enfermo,

Já não sabe expressar sublime afeto,

   Contudo, não vê o termo

Do humílimo amor que em ti projeto


   Pois quão de ti longe estou,

Por Ele e só com Ele inda me sinto

Ledo do bem que a vida me negou,

   E antes, quando labirinto,


   Cego e atônito vivia,

Sem mesmo ver-me em mim próprio,*

   Ou ouvir o que eu me dizia,

Tu, destes-me, então, o passo sóbrio


   Que eu tanto perseguira,

E nem Musa, nem Ardor, nem Amada,

   Nem dissabor ou ira,

Nada! Nada! Enfim, mil vezes, nada!


   Dera-me esta aurora,

Que a minha vista enfim içasse ao Céu,

    Exortando os males de outrora,

Que divagar fizera-me lá ao léu


Feito ébrio vadio que a mazela canta,

    Só sabido que a tristeza

Faz do humano coração almoço e janta,

    Resta-me, tua Nobreza


    E teu caráter tão augusto,

Tão integro tão reto e, tão nu,

    Cantar em verso sem custo!

Que, quiçá, o mui fiel servo Jaú


    Do bom vate Português,

Se, acaso, nesta era, aqui vivesse

    Seria hoje um Burguês!

E, porventura, se esta Ode lesse


    Diria: oh! Paródia xula

Que se se estampasse em jornal

     Co’ a foto duma mula

Ainda insultaria o que é boçal!...


     Inda assi me não retrato,

Posto que a ti, gentil Maísa, são,

     Esses versos, de fato,

Visto que logo este meu coração


     Prostrar-se-á, abatido,

Por singelo perdão, tanto aflito,

    Que a tua querença, unido

Já dele duvidar, logo, hesito...


   Portanto, vens comigo,

A Beleza cantar do ameno prado!

   Pois todo Mal, contigo,

A esp’rança traz-me do porvir agrado...


   Olhemos cá o ribeiro

Tão silente e brando já a correr,

   Até parece um romeiro

Que incansável celebra o alvorecer!


   Esqueces a urbe ingrata,

Que até ventura lá tem o seu preço,

   E algibeira sem prata

É reles e indigna de apreço!


   Sejamos, então, apenas

Da vida, Iluminados Vagabundos,

   Que em estórias pequenas

Não vêem caber seus sonhos profundos!


   Eis, Maísa e Josino,

Cada um é do outro a boa metade,

   E que não ouse o Destino

Usurpar o Amor desta Amizade!...


                            (Queiroz Filho)






Comentários

Postagens mais visitadas